Uma equipa de investigação, coordenada por Cláudia Seabra, docente da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (FLUC) e investigadora do Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT), analisou a percepção da qualidade de vida por parte de residentes e turistas, e o impacto da pandemia de covid-19 nessa percepção.
Esta análise articulada entre quem habita e quem visita as cidades permite registar diferenças, semelhanças e particularidades dos dois lados – turistas e moradores –, aspectos cruciais para gerir a sustentabilidade dos destinos turísticos. Entre os domínios analisados neste estudo encontram-se bem-estar da comunidade, questões urbanas, modo de vida, orgulho e consciência da comunidade, força económica e oportunidades de recreação.
Esta é uma das primeiras apostas na medição do conceito “Percepção da Qualidade de Vida” que, por norma, “tem sido usado apenas para fazer leituras isoladas das percepções de turistas ou residentes”, destaca Cláudia Seabra. Apesar desta tendência, a investigadora considera que “é muito importante analisar ambas as percepções e as interacções entre turistas e residentes, devido aos impactos sociais da indústria do Turismo”. Tal significa que “os destinos turísticos precisam de avaliar a percepção da qualidade de vida de residentes e turistas para melhorar a experiência e índices de satisfação de ambas as partes e, assim, equilibrar a relação entre turistas e moradores”, elucida. Por outro lado, “nenhum estudo, publicado até hoje, avaliou o impacto da covid-19 na Percepção da Qualidade de Vida. É importante perceber se turistas e residentes alteraram as suas percepções depois da pandemia”, acrescenta ainda a professora da Faculdade de Letras da UC.
Coimbra foi o caso de estudo deste trabalho científico, que decorreu entre 2019 e 2021 (antes e durante a pandemia), com pessoas com idades compreendidas entre os 18 e os 42 anos. No total, foram inquiridos 751 residentes e 605 turistas. Sobre a escolha de estudar as gerações Y e Z, a especialista clarifica que “estas gerações representam o futuro dos mercados turísticos, tanto do lado da procura como da oferta, o que significa que, para antever a sustentabilidade da indústria do Turismo, é crucial analisar os hábitos e comportamentos destas gerações, que vão influenciar as gerações seguintes”. “Estas foram as gerações mais impactadas pela pandemia, nomeadamente nas suas dinâmicas sociais”, conclui Cláudia Seabra.
Os resultados indicaram que, apesar da pandemia, residentes e turistas têm uma elevada “Percepção da Qualidade de Vida”. Contudo, o parâmetro “Questões Urbanas” foi o que obteve um nível de avaliação mais baixo, por parte de residentes, mas também de turistas. Cláudia Seabra sublinha que «este é um resultado importante que deverá ser analisado pelas entidades locais, considerando que tanto para residentes como para turistas a “prevenção de aglomeração e congestionamento” e o “controlo de trânsito” são aspectos cruciais». “Os velhos problemas ligados ao trânsito foram sobrevalorizados durante a pandemia, assim como a prevenção de aglomeração e congestionamento, contribuindo em larga medida para este impacto negativo”, destaca.
No lado aposto, com a avaliação mais alta, ficou o domínio “Orgulho e Consciência da Comunidade”, “a ser considerado um aspecto muito positivo para as gerações mais novas, resultado que pode estar relacionado com o facto de Portugal ser um destino que acolhe pessoas de várias nacionalidades e culturas, e Coimbra, em específico, ser uma cidade universitária para onde estudantes de todo o mundo trazem diferentes culturas e tradições, contribuindo para um ambiente mais cosmopolita”, explica a investigadora da UC. Igualmente com avaliação alta ficou o domínio “Modo de Vida”, que aumentou durante a pandemia, o que revela que “os relacionamentos sociais e a indústria do Turismo foram cada vez mais valorizados no período pandémico, tanto para turistas como para residentes”, explica a especialista.
“Um resultado surpreendente”, sublinha Cláudia Seabra, decorreu na análise do domínio “Força Económica”, “em que apenas os turistas atestam a existência de lojas e restaurantes pertencentes a residentes, assim como preços de bens e serviços justos, algo que foi mais criticado por residentes que tiveram uma maior consciência dos preços elevados e do desaparecimento de negócios durante o período pandémico”.
No último parâmetro analisado, “Oportunidades de Recreação”, a docente elucida «que teve uma classificação mais alta durante a pandemia, mostrando que turistas e residentes atribuíram mais valor aos aspectos “Variedade de festivais, feiras e museus” e “Variedade de prática desportiva para praticar e assistir”, pois durante a pandemia os jovens valorizaram mais estes aspectos».
“Este estudo é inovador na medida em que, pela primeira vez, foi possível comparar a Percepção da Qualidade de Vida entre residentes e turistas das gerações mais jovens e foi possível perceber o impacto da pandemia naquela percepção. Os resultados comprovam que a pandemia veio alterar a forma como encaramos a nossa percepção de bem-estar e de qualidade de vida de forma global. Precisamos de olhar para a indústria do Turismo a partir desta visão simbiótica entre turistas e comunidades locais. Saber o que os residentes sentem é fundamental para pensar um turismo mais sustentável ao nível económico, social e até cultural», remata a investigadora.
Fonte: Campeão das Províncias
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